quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Coragens e covardias


A vida toda fui muito medrosa. Tinha medo de dormir sozinha, medo de chuva, medo de avião. Medo de perder meus pais, medo de filme de terror, medo de altura, de velocidade, medo de mar agitado. Quem tem medo do lobo mau? Eu tinha. Fui uma criança tão assustada que acho que eu tinha o medo em si, como alguém que sente frio. O medo puro e insuportável, como um própolis.
Curisosamente, no entanto, sempre tive fama de invencível. Meus amigos admiram minha coragem, você que saiu da casa dos pais, você que mudou de profissão, de cidade, de marido. Você que mudou  de nome.
Por ser tão medrosa e parecer tão corajosa, cheguei a achar que eu era uma boa enganadora. Uma mentirosa perfeita. Mas não.
É que, na verdade, pra mim,  medo e coragem são mesma coisa. São dois estágios de um mesmo acontecimento, o antes e o depois de uma mesma causa. Sem medo é impossível existir coragem, e não fui eu que inventei essa frase, mas adoro.
Todos os meus movimentos aparentemente decidos e corajosos não são os passos calculados e frios de um predador. Não se trata de um leão partindo pro ataque.  Se eu me jogo de alguns precipícios, se eu saio correndo quase sem olhar pra trás, se eu não uso colete de salva-vidas nas minhas histórias é por puro pânico.
Me vejo muito mais como um pássaro desastrado que se joga da árvore sem saber voar só porque um predador está vindo. Eu nao sou o leão, nunca fui, isso é só um disfarce. A vida toda eu senti como se alguma coisa me ameaçasse, uma onda enorme vindo e se eu não corresse ela ia me derrubar.
Ir em frente, decidir, pra mim, nunca foi opção. É mera sobrevivência.
Todas as vezes que me movi e promovi as tais mudanças da minha vida que todo mundo chamou de coragem foi quando ficar parado ia me matar de alguma forma.
Por isso não acredito em coragem como um estado permanente, eu duvido do corajoso em si.
Esses programas de aventura em que o sujeito se joga de caiaque de uma cachoeira a 70 metros de altura – juro - me dão sono. Se a pessoa está super tranquila em nadar com crocodilos, qual a coragem? Lamento informar, amigo, mas se você não tem medo nenhum de pular de para-quedas e faz isso todo santo dia, me desculpe, mas você não é um corajoso: é um exibicionista.
Ao passo que se você morre de medo de barata e mata uma sozinha, se tem vertigem de mar e dá um pequeno mergulho, se tem pânico de falar em público e consegue dizer um “obrigada” que seja no microfone, aí sim, você é meu tipo de corajoso. Ou um covarde, mas que faz absoluta questão de sobreviver.

3 comentários:

  1. Encarar nosso medos é como amadurecer 10 anos em meses, só que sem as rugas. Adorei seu blog, muito bom encontrá-lo. beijos Giuline

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  2. amiga querida,

    obrigada por compartilhar coisas suas tao particulares, tao unicas, e ao mesmo me explicar quem eu sou. e vc ainda faz isso com uma inteligencia e fluencia verbal que da raiva.

    esse texto, alias, seu blog, é T-U-D-O.

    saudade absurda.

    beijos enormes
    Carol Gesser

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  3. obrigada por verbalizar tão bem o que eu sinto também :)

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