segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Aqui todo mundo é peão

Se você ainda não gosta de São Paulo é porque ainda está olhando pra ela de longe, da janela tripla e plástica de um avião. São Paulo não foi feita pra ser vista de cima. Pra gostar daqui tem que descer pra ver de perto. Tem que parar pra ver de dentro. Em São Paulo cada amigo é que é o seu monumento, sua pracinha, a sua praia. E quando um deles vai embora, a sua cidade fica completamente bombardeada, dilacerada, absolutamente apocalíptica. 

Desde que cheguei, há uns 6 anos, já tive uma meia dúzia de São Paulos. Você de muda de emprego, de bairro, de profissão. Conhece gente nova, muda de sotaque, aprende os vocabulários, os figurinos, os endereços. Aí quando se apega àquele novo mundo, quando começa ficar gostoso, quentinho, quando tá começando a virar uma família, “ah, agora eu posso ficar aqui pra sempre”…pronto: aquela gente maravilhosa simplesmente tem a petulância de ir ser feliz e viver a vida em outro continente e todo aquele planeta vai junto. E fim.

Não é que nem o Corcovado que está lá pra sempre, entende? A Claudinha foi embora e nunca mais teve festinha no palácio dos Jardins. A Pri foi embora e a gente nunca mais vai poder tomar banho de psicina na casa dela falando mal de alguém. A Ana Luisa vai me abandonar e eu não vou nunca mais saber chegar naquela pracinha que ela me levou com Inacio no sábado mais delícia do mundo. É, é cruel desse jeito. 

E lá vai você, com seu LEGO emocional esquizofrênico em pedaços, tentar montar outra cidade do dia pra noite. Parece muito trabalho pra pouco tempo e é. Só que essa coisa de levar um dia depois do outro pode valer pra outras paragens, aqui não: em São Paulo às vezes a gente pula uns três, quatro meses de tanta ansiedade. Aqui, amigos de 2 anos viram de infância, amores de 6 meses já são eternos. São Paulo é pra quem tem essa vontade quase cafona de viver histórias grandiosas, ir atrás de paixões hollywoodianas. E quem tem essa alma grande e bandeirante não fica sossegado mesmo em canto nenhum. Ninguém vem pra cá atrás de sombra e água fresca - até porque não temos árvore e tá faltando água. Sim, eu sei de tudo isso.

Mas mesmo gostando, mesmo sabendo, toda vez que alguém vai embora e eu tenho que demolir um mundo e erguer um novo condomíminio dentro de mim dá uma preguiça imensa e uma raiva sem precedentes.A Ana Luisa vai deixar um buraco de dois metros de profundidade no meio da minha  Avenida Paulista particular (e olha que eu tenho pouco mais de um metro e meio). Vai ter revolta, vai ter panelaço na minha alma. Até eu descobrir um atalho ou aprender a andar de bicicleta vai ser caótico. 

Por isso, amigo, se você já aterrisou e pegou gosto por essa terra aqui, apenas um cuidado: São Paulo acaba. Um dia você acorda e sua São Paulo foi implodida sem plebiscito, sem votação, na maior arbitraridade. Nem adianta culpar Haddads, Malufs, Kassabs, não adianta xingar todos os sobrenomes árabes. 

E toda vez que a sua São Paulo acabar você vai vai ver que aqui todo mundo é peão. Aí não tem jeito: pegue sua enxada sentimental, respira fundo esse arzinho seco e poluído e mãos à obra pra reconstruir sua cidade sozinho. 

E sorria, viu, que a graça é um pouco essa. 

terça-feira, 28 de abril de 2015

Have a marguerita for me. Say hi to everyone.

- Anna is flying from Chicago, Paula confirmed too. I made a reservation at this new awsome Mexican place in Brooklyn. I told everyone you are coming. Cause you are coming, right?

I was really excited, she yawned.

-Yes. Probably. I mean, If everything is ok with him. Say hi to uncle Lisa, Nate!, - she said with this awkward  fake baby voice. The kid started crying the second Angela spelled his name. 
-Hello, small creature - i tried.
-He woke up more than 17 times this night. I mean, i stopped counting at 17 but it was probably 22 ou 23 times. Do you think it’s normal?
-I don’t know, you should google it. By the way, they have margueritas there! They are your favourites, right?

I could hear her turning the TV on. Now Mickey Mouse was singing out loud between us.

-I think they were, yeah. But I’m still breastfeeding.
-Jesus, It’s friday night, and here we are, talking about breastfeeding. Can you turn this down?
-What?
-This music, i can barely hear you.
-Oh, sorry, it’s the only thing that calms him down. 
-It is, right? - i doubted.

Now Minnie happily joined the song, and Nate decided to cry louder in revenge.

-So tell me more about this new place you guys are going tonight! 
-So you are not coming. 
-I didn’t say that. Did i?
-It’s one day in the year, Angela. 
-Of course you don’t understand.
-Ok, I got it.  I’ll call you as soon as i have a baby so we can share some information about poop and diapers. How does that sound? Good bye.
-Hey Lisa…? Wait. 

She changed her mind, i thought for a second. But then Donald Duck started his very own inspired solo on background.

-Have a marguerita for me. Say hi to everyone.

More crying. This baby was definetely not a Disney fan.

-Yeah, you too. Say hi to Nate.

segunda-feira, 23 de março de 2015

Carpe Diem tatuado no cócxi

É fácil entender toda a auto-ajuda barata do mundo. Uma semana internada num hospital com uma doença semi-grave e quando se dá conta, plim! Você virou uma mistura de Ana Maria Braga com Padre Marcelo Rossi. 5 dias de UTI são tão traumáticos que você vai rapidinho adotar o discurso de “aproveitar os pequenos momentos”, “o que vale mesmo é família e amigos” e que “o importante é ter saúde que o resto a gente corre atrás.” E tudo isso é tão absolutamente verdadeiro, que é preciso muito cinismo, mau humor e sarcasmo pra superar a vontade louca que estou nesse momento de tatuar um Carpe Diem bem grande no cócxi e sair cantando Singing in the Rain pelada em plena Avenida Paulista apenas por estar viva.
Para evitar esse tipo de constrangimento, resolvi escrever sobre o assunto. Como eu tenho muito medo de alguém usar minhas frases como template cafona de superação no Instagram , aqui vão as coisas que de fato me salvaram na UTI (embora os médicos insistam em dizer que foi hidratação e repouso):
1.     O CLIMA DE FIM DE MUNDO NA GLOBONEWS. As trapalhadas de Dilma e a alta do dólar na cobertura da Globo faziam parecer que o mundo ia acabar todos os dias. E quando você tá na merda, dá uma sensação boa saber que tá todo mundo na merda também!
2.     FACEBOOK, POR FAVOR NUNCA VIRE UM LUGAR RESPEITÁVEL. Selfies constrangedores, memes imbecis e discussões superficiais, ah, que dádiva! Meu braço estava furado em 4 lugares diferentes e ainda assim eu tinha motivos para sorrir. Zuck, obrigada por esse mar de ignorância, se o Face fosse um simpósio acadêmico talvez eu não estivesse mais aqui.
3.     MÃE, MARIDO, AMIGOS E FILHO. Obrigada mamãe pelo eterno otimismo – “Essa sopa de jiló do hospital tá com uma cara ótima! Hmmmm! Melhor que a do Maní!”. Obrigada meu marido de 1 metro e 92, por ter dormido todos esses dias numa cama que terminava na altura de seus joelhos. Obrigada Inacio, por não entender nada e ter ficado brincando de fazer a cama subir e descer como se fosse a coisa mais legal do mundo. Obrigada aos amigos super presentes que mandavam mensagens e que me fizeram chorar de tanta fofura. E aos amigos ausentes por terem continuado ausentes! Tem uma galera do Rio que no dia que aparecer aqui eu vou ter certeza de estar à beira da morte!
Agora chega de agradecimento que isso aqui não é Oscar, é dengue. No episódio de hoje amiguinhos, aprendemos que se você tá reclamando de comida de avião, cama de hotel e alta do dólar, você tá ótimo! Comida de hospital, cama de UTI e baixa de plaqueta, isso sim que é fim de linha.
E podem ter certeza que depois da dengue eu me tornei uma pessoa melhor e nunca mais reclamarei da vida, nunca mais falarei mal de ninguém e nunca mais gastarei fortunas em roupas que não preciso. Não sem antes passar um belo de um repelente.