sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Sinceridade


- Oi, amor
- Ana, a gente precisa conversar. 
- É a nova empregada, né? Olha aqui como ela arruma as coisas. Tudo assim, verticalzinho, viradinho...Fora que ela fica pendurada no telefone o dia todo. 
- Ana, eu conversei com a Cláudia...
- Cláudia? A nova empregada não é Cleide? 
- Ana, eu tô falando da Cláudia, minha psicóloga.
- Desde quando a sua psicóloga se chama Cláudia?
- Desde o dia que ela nasceu, Ana. É o nome dela.
-Não, Luciano. Quando eu te conheci você ia na psicóloga, pagava a psicóloga, mentia pra sua psicóloga. Mas Cláudia, Cláudia assim, sem nem sobrenome, é muita intimidade...
-Tá vendo, é isso, é impossível, você tem ciúmes até da minha psicóloga.
-Não, não, não. Da sua psicóloga eu nunca tive ciúmes. Eu tô com ciúmes é dessa tal de Cláudia que eu nunca ouvi falar. E que – pior – agora é a razão pra você querer conversar comigo.
-Eu acho que a gente deve se separar.
-Você acha ou a Cláudia acha?
-Ela concorda.
-Quem essa vadia pensa que é pra acabar com o meu casamento assim? 
-Ninguém tentou salvar esse casamento mais do que a Cláudia.
-E quem disse pra ela que nosso casamento era algo que precisava de uma salvação?
-Ana...
-O sobrenome.
-Que?
-Eu quero saber o sobrenome dela.
-Você tá louca.
-Anda, Luciano. 
-Você vai fazer o que, matar ela?
-Eu só quero falar com a pessoa. Que mal pode haver nisso? Se ela te convenceu que a separação é a melhor coisa pra gente, quem sabe ela não me convence também?

Ana vai até o consultório.Uma senhora de seus de 75 anos e bem gorda abre a porta. 
-Oi, eu vim falar com a Cláudia.
-Pois não.
-Ela está?
-Sou eu mesma.

Era pra Ana ficar feliz, mas que nada. Mulher prefere sempre ter razão. Ana volta pra casa com mais raiva ainda do marido.
-Você não vale nada mesmo, Luciano. Por que você não disse que a Cláudia era daquele jeito?
-De que jeito?
-Gorda, Luciano! Velha! Ela deve ter uns 100 anos.
-Isso não tinha nada a ver com a nossa conversa.
-Como não? Eu achei que você tava apaixonado pela Claudia. Quem é então, me diz.
-Não tem ninguém. Eu só quero pensar na vida. 
-Que novidade é essa de pensar na vida? Você nunca foi disso. 
- Eu tô sendo sincero.
- Se eu pego essa vagabunda. 
-Você quer achar um culpado fora da história. Como se aqui dentro não tivesse motivo suficiente. Quem acabou com o nosso casamento foi a nossa preguiça, nossa indiferença, a nossa infinita capacidade de ser óbvios. A gente é tão óbvio, Ana. Tão previsível.

Ana para pra pensar. Luciano confunde ela quando fala bonito assim. 
 - Nossa separação não é culpa da Cláudia, querida, nem da coitada da Cleide.
- Peraí. "Coitada" da Cleide?
-Ana...
-É a Cleide, né? Eu sabia. É tão a sua cara comer a empregada, Luciano. Não vai me dizer que é com você que ela ficava pendurada no telefone o dia todo.

Luciano desistiu de ser honesto, abriu mão de separar e começou a comer a Cleide no dia seguinte. 
Ele bem que tentou,  mas sinceridade dá muito trabalho. 


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