A mãe quando
queria educar a gente sabia ser má. Eu falava errado, minha irmã copiava e a
mãe tinha vergonha, queria que a gente falasse que nem os filhos da Dona
Eliane.
Compra um
chocolate pra mim comer, eu pedia, Faz um suco pra mim beber, choramingava.
Mim não come,
Isabel. Mim não bebe.
E nada de
chocolate, de suco, mim não tinha direito a nada disso.
Os filhos da
patroa, esses sim, falavam um português de dicionário e a mãe achava bonito.
Pra eles, tudo. E se a gente já usava as roupas velhas dos marmanjos, se já
comia o que eles deixavam, porque não podia tomar vergonha e falar direito que
nem eles?
Dá 5 cruzeiros pra
mim comprar um chiclete?
Mim não compra,
Isabel.
Depois já na escola
eu desaprendi a falar errado. Me dá um chocolate pra eu comer?
A mãe descansaria
aliviada se tivesse vivido pra me ouvir ser tão gramática.
Fui eu - e não mim
- que passou na faculdade, que emoldurei diploma, que aprendi a pedir certo até
em inglês.
Mas ninguém me
convence que dizer mim não é mais bonito: mim tem muito mais poesia que eu.
Só não tenho
coragem de usar na frente dos outros. Ainda acho que se pedir com mim a mãe vai
ouvir de algum lugar e voltar só pra brigar com a gente. E Deus me livre de
aborrecer fantasma.
Na época não via,
mas hoje percebo como era engraçado ser criança na casa da Dona Eliane: a mãe
não dava nada pra mim comer e quem ficava com vontade de tudo era eu.
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